A Política em moldes espíritas, por Raimundo de Moura Rêgo Filho

Tempo de leitura: 7 minutos

Raimundo de Moura Rêgo Filho

Uma das razões preponderantes da estada de Jesus entre nós foi o ensino das boas políticas, da boa Doutrina. Neste mister, a Doutrina codificada por Allan Kardec, traz em seus ensinamentos, todo um espectro de conhecimentos que objetivam a vida em sociedade. Não uma sociedade sabidamente eivada dos maiores vícios, mas de uma sociedade regenerada sob a luz do evangelho, responsável por seus próprios atos, melhorada interiormente, efetivamente participativa no trabalho no bem e na ajuda ao próximo, fazendo soar em cântico exaltado as palavras do Mestre: “amai-vos uns aos outros”.

Nosso tema de hoje é política. Conversaremos sobre ele, buscando fazer crescer a importância do conhecimento da política no seio do movimento espírita brasileiro, sem nos afastarmos um milímetro das proposições doutrinárias encontradas na Codificação e em “Obras Póstumas”.

Política, a palavra, tem seu berço etimológico na Grécia antiga, traduzindo a necessidade do Estado ou cidade (polis), em ter uma ciência que estudasse os fenômenos referentes ao Estado ou cidade. Tal ciência iria ditar o conjunto de objetivos que viriam a nortear a condução deste Estado.

Mas o que teria em comum a política com o espiritismo? Diria eu… Tudo!

Vejamos: No campo do evangelho, poder-se-ia afirmar que todas as ações e ensinamentos de Jesus, foram obras de arquitetura política. Se nos prendermos ao conjunto de ensinamentos morais contidos no decálogo, logo veremos que ali, bem explicados estavam os objetivos que norteariam o Homem (espírito encarnado), na condução de suas atitudes para com o meio ambiente e para com a sociedade, logo, tais instruções, de valor incalculável, eram e o são, políticas de boa vontade e progresso. Tais ações, preconizadas e exemplificadas por Jesus de Nazaré, modificaram totalmente a visão, entendimento, moral e vida de muitos que as presenciaram. Seus doze apóstolos, delegados que eram pelo Mestre, agiam em favor da divulgação e implantação destas políticas, por onde quer que fossem.

Entretanto, toda política nova, que modifique tanto e tão profundamente, o que já se achava estabelecido, gerado castas e autoridades aristocráticas, não poderia ser bem recebida pelo poder institucionalizado. Desta forma, o incômodo surgido, haveria de ser debelado, e rapidamente… sobrevieram as complicações, as perseguições, e por fim, o Mestre dos mestres, por outra atitude política, desta feita acionada por Pôncio Pilatos, ao lavar suas mãos, entregou à crucificação, entre ladrões, o filho do homem, talvez por isso, em sua onisciência, Jesus tivesse sentenciado os acontecimentos vindouros ao afirmar: “Não creiais que venha trazer a união, pois que trago a desunião; não creiais que venha trazer a paz, pois que trago a Espada”. A espada e a desunião apregoadas por Jesus em suas palavras, eram exatamente as decorrências que adviriam da implantação de suas políticas de amor e progresso. Eram tempos de barbárie, tempos difíceis, aqueles. Mesmo hoje, encontramos sem muito trabalho, a mesma barbárie e ignorância, no seio de nosso planeta… e quanto já temos caminhado!

O que não se pode obstar, é que estas políticas, trouxeram uma nova visão a todos quantos as experimentaram e com o correr do progresso, haurido por elas, pelo óbolo da reencarnação, vieram por modificar também um contingente incomensurável de espíritos que, a cada volta ao planeta de provas e expiações, traziam consigo mais elementos de melhoria, continuando a espalhar as políticas de antes, agora renovadas e melhoradas, durante os périplos pelos quais passavam.

Não é sem o justo conhecimento e estudo que o filósofo Duguit afirmou: “O homem é um animal social”; de outra feita, como a corroborarem o pensamento de Duguit, a espiritualidade superior afirmou: “o homem é um ser gregário”. Ora, este ser, que se agrega em comunidades desde os primórdios, sempre necessitou de formas de governo que lhes provessem o sustento, a segurança e a continuidade da espécie e durantes os milênios vem aperfeiçoando estes sistemas sociais de acordo com o intelecto e a moral que hajam haurido. Sofrendo por isso a ação destas normas (políticas), ad seculum seculorum.

Na Roma antiga, mais intelectualizada, quando do período de mudanças no Estado, os concorrentes aos cargos se vestiam de branco para mostrarem a limpeza de seus atributos e a altivez de seus predicados, sendo por isso chamados de cândidos, dando origem ao conhecido vocábulo; candidato. Mas se perdiam em meio ao orgulho e vaidade, formulando leis (políticas), que visassem não ao bem geral e sim aos seus próprios e suspeitos desejos. Mais de mil anos se passaram e o quadro não mudou muito, estes cancros morais, são de tal sorte, inebriantes para alguns que se cristalizam profundamente na psique profunda e subvertem a estada da alma em sua passagem na Terra.

O professor Denisard Hypollite Leon Rivail (*), o nosso Kardec, estudou detalhadamente o assunto e, em seu livro “Obras Póstumas”, acostou um vasto material de pesquisa, que hoje é tema de estudos em toda casa espírita séria. Nela, Kardec, ao escrever sobre as aristocracias assim começava: “aristocracia vem do grego aristos (melhor) e kratos (poder); Na acepção literária significa: O Poder dos Melhores. Hão de concordar que este significado tenha sido, muitas vezes deturpado. Vamos apreciar a influência que o Espiritismo pode exercer sobre esta concepção e os seus resultados”.

Desde o começo dos tempos, nenhum povo ou nação desprezou chefes, mesmo ainda no período de selvageria. Isto porque devido a diversidade de caracteres e aptidões, havia sempre entre a raça humana, os incapazes que necessitariam de ser dirigidos, fracos que reclamavam proteção, paixões a combater; denotando, daí, a necessidade de uma autoridade. Tal autoridade, no início, era mister dos chefes de família (paeter familiae), dos anciãos, dos patriarcas. Esta, a primeira forma de aristocracia.

Com o crescimento das sociedades, tornou-se, em certos casos, impotente esta expressão aristocrática, as questões entre povos vizinhos e as guerras inerentes a tais questões, reclamavam por homens fortes e inteligentes, na esperança de garantia contra os ataques inimigos. Surgia a aristocracia militar. Muitos destes, porém, apossaram-se do poder, valendo-se de sua posição. Os vencedores fizeram dos vencidos seus escravos, instituindo a autoridade da força bruta; esta, a segunda expressão aristocrática.

Com a transferência de poder aos filhos assim se perpetuava a aristocracia, o poder e a fortuna impingiam aos fracos e pobres a autoridade herdada e estes não ousavam resistir. Acreditavam os primeiros como herdeiros dos direitos conquistados por seus pais. Surgiam as primeiras divisões de classes. Originariamente a dos que dominavam a dos que eram comandados. Eram os albores da Aristocracia do nascimento, que viria a se tornar tão forte e preponderante como a da Força bruta.

Ora, não podendo aquela aristocracia sustentar as classes comandadas, estas procuraram sustento no trabalho comum, e a necessidade de alargarem seus horizontes de trabalho, impôs-lhes as viagens por outras terras. Com estas viagens sobre veio a maior inteligência dos fracos e pobres que em se sabendo superiores numericamente aos da classe dominante, vieram por derrogar as leis anteriormente feitas em favor dos interesses daqueles que os dominavam. “Não estaria aí a presença da mão da providência?” – perguntou Kardec.

Elevava-se o novo poder: O Poder do Ouro. Este dispunha sobre coisas e pessoas… Mas, tal período encontraria seu declínio quando os herdeiros deste se mostraram mais hábeis no gastar do que no arregimentar maiores fortunas. Consequentemente nascia a nova aristocracia; a da Inteligência, diante da qual o rico não aviltaria o pobre nem o forte ao fraco.

Neste ponto Kardec faz nova pergunta: “Seria esta, a última? A maior expressão da humanidade civilizada?”. A resposta chega enfática: “Não!”. E se explica, logo a seguir: “a inteligência sem o penhor da moralidade faz com que o homem, por vezes, use mal de suas faculdades. Por outro lado, a simples moralidade pode não ter capacidade. Sendo, pois, necessária à união da inteligência e da moralidade para haver a legítima preponderância, a que a massa se submeterá, confiada em suas luzes e justiça”.

É nosso concluir, tal como o fez Kardec, que venha a ser esta, a última das aristocracias, sinal do advento do Reino do Bem sobre a terra. Kardec concluía que esta viria naturalmente, pela força dos acontecimentos e quando os homens de categoria fossem tão numerosos que viessem a constituir maioria, a massa popular lhes confiaria, então, os próprios interesses.

Neste ponto, pensamos ser necessário um mergulho nos ensinamentos encontrados em “O livro dos Espíritos””, no capítulo VII (Lei de Sociedade), para que investiguemos juntos, alguns pontos.

Em primeiro plano figura a vida social, presente na sociedade (questão 766). Deus, objetivando o bem e o Progresso da raça humana, não lhe poria nas mãos faculdades tão importantes se não os tivesse criado para a vida em sociedade. Sabia-o de antemão, que estas populações de almas (espíritos encarnados), haveria de se agregarem comunidades, estas cresceriam envolvendo-se em coletividades maiores, inter-relacionando-se socialmente e estando todas elas sob a égide da Lei Natural, o seu progresso intelecto-moral só chegaria por meio da execução de políticas necessárias ao desenvolvimento e adequação de tais sociedades pela inter-relação entre massa e poder. Sendo o poder, exercido por homens de qualidade, saber justiça e bondade, a marcha inexorável do tempo os levaria a patamares superiores tanto material quanto espiritualmente.

Esta uma das razões preponderantes da estada de Jesus entre nós; o ensino das boas políticas, da boa Doutrina. Neste mister, a Doutrina codificada por Allan Kardec, traz em seus ensinamentos, todo um espectro de conhecimentos que objetivam a vida em sociedade. Não uma sociedade sabidamente eivada dos maiores vícios, mas de uma sociedade regenerada sob a luz do evangelho, responsável por seus próprios atos, melhorada interiormente, efetivamente participativa no trabalho no bem e na ajuda ao próximo, fazendo soar em cântico exaltado as palavras do Mestre: “amai-vos uns aos outros”. A sociedade dos Homens de Bem. Estes, não necessariamente seriam espíritas, pois que em a base, toda religião é boa e tendente a levar o homem a pórticos mais alteados, mas que se pautassem pelas mesmas ações e atitudes exemplificadas pelo Rabi.

Acerca da questão 768, do mesmo livro, a necessidade primeira é uma imposição da Lei do Progresso: a vida em sociedade. Sem ela o homem estiola e embrutece. Neste sentido, o Espiritismo forja homens melhorados, perseverantes no Bem. Mas, que utilidade traria a Doutrina se o uso deste saber permanecesse enclausurado entre as paredes das Casas Espíritas? Seríamos somente um punhado de “gatos pingados””, incrivelmente egoístas, que nem mesmo levaríamos em conta as palavras do Mestre quando nos avisava: “Dai de graça o que de graça recebestes”. Enclausurados entre as paredes de pedra da Casa Espírita, discutindo o que somente a nós poderia interessar como se fôssemos o centro do mundo, sem a ação do trabalho, a vontade de melhorar o todo, o globo, sem a visão de participar da verdadeira globalização: a “Globalização Moral.” Neste caso, o Espiritismo seria uma doutrina natimorta, tal qual uma árvore estéril que não dá bons frutos.

Todavia, quando abordamos a política como tema de debate e estudo dentro da Casa Espírita, há que se estar com a mente aberta para os postulados morais que serão, como sempre o foram, o divisor de águas, no rumo de uma sociedade mais justa e igualitária. Cidadania, Política e Espiritismo hão de se transformar, em dias vindouros, no tríplice pedestal que suportará a base da sociedade dos Homens de Bem, tal qual perfilado na questão 793, de “O livro dos Espíritos”, o conceito de civilização completa.

Assim, quando se trata de política em moldes espíritas, não se quer fazer da Casa Espírita um local de contendas político-partidárias. O conjunto dos conhecimentos espíritas, derivado da intermediação entre os dois mundos, material e espiritual, propõe-nos uma vida regenerada, melhorada em moldes morais e intelectuais, o indispensável alimento para o sadio crescimento da recém-nascida sociedade justa. Não se irá querer, portanto, sacudir bandeirinhas ou distribuir santinhos deste ou daquele candidato nas Casas Espíritas. E, sim, que o conhecimento espírita seja utilizado em prol da melhoria do todo, que em primeiro plano se origina em nós próprios, para depois “contaminar” beneficamente, Municípios, Estados, o País e, quiçá, o globo inteiro!

Nota do ECK: Assim se encontra grafado o nome de batismo de Allan Kardec, conforme a imagem abaixo:

Imagem: Pixabay

Acesse os textos da edição em cada link:

Faz Política quem vai, e quem fica, por Célia Aldegalega

O Espiritismo e a legítima luta por um mundo melhor, por Manoel Fernandes Neto

Por que o espírita deveria ser apolítico? por Nícia Cunha

Devemos participar das políticas públicas?, por Geylson Kaio

A Política em moldes espíritas, por Raimundo de Moura Rêgo Filho

A imersão política na essência ética, por Nelson Santos

Participar para evoluir!, por Leopoldina Xavier

 

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