Conservação ou Conservadorismo, por Débora Nogueira

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Débora Nogueira

Estamos em um mundo cíclico, como é a figuração filosófica do rio de Heráclito: o rio muda o tempo inteiro. Esta mudança deveria destinar os homens a repensarem suas atitudes em relação a si mesmos, ao semelhante, ao planeta. Em relação a este último, a Terra não é, para a humanidade, uma eterna e inesgotável fonte de extração, a ser explorada até a exaustão.

Fico indagando qual seria a diferença entre conservação e conservadorismo. Conservar é manter-se em bom estado. Agora, conservadorismo é a manutenção das instituições sociais e tradicionais no contexto cultural e de civilização. Para este último, tudo tem que estar como sempre foi.

Em “O livro dos Espíritos” é apresentada a Lei de Conservação, no capítulo IV do Livro Terceiro. Nele, nos deparamos com conceitos como o instinto, a preservação do meio ambiente, o desapego. Também, as noções fundamentais e distintivas entre o que seja necessário e o que seja supérfluo, falando das necessidades que criamos e aquelas que realmente são fundamentais à sobrevivência.

Neste cenário, os extremos sempre nos levam a posições conflitantes, seja pelo excesso ou pela escassez. Muitos, atualmente, neste mundo, organizam suas vidas em situações que visam basicamente a matéria. Assim, para estes, o melhor caminho é ter, possuir, fazendo girar a roda gigante do poder monetário e, com isso, obtendo o prestígio e o reconhecimento social. Aquele que tem, manda! E, por conseguinte, os que ainda não chegaram a determinado patamar, ficam numa agonia constante de chegar, alcançar, uma corrida insana pelo poder, principalmente o poder do TER.

Em geral, todos lutam para se preservar, seja por questões de segurança, saúde, alimentação, bem-estar… Mas, quanto a viver em sociedade e pensar no coletivo? Ah! Aí já é outra estória. Cada um quer para si. Se puder chegar aos outros, que seja! Mas, também, se não chegar, paciência…

Aquele que, muitas vezes, chega ao topo da pirâmide social tem a visão de que mereceu por todo o esforço desprendido. Certamente, isto ocorre em relação aos que de fato se esforçaram. Outros, herdaram, legitimamente. Mas, em geral, as pessoas esquecem que nem todos tem as mesmas oportunidades.

Vivemos em um país onde oportunidades e privilégios convivem lado a lado. E, em termos de oportunidade, devemos considerar as diferenças entre aquele que possui um dado grau de escolaridade diante daquele que sequer foi alfabetizado. Isto é gritante. Então, há privilégios, para poucos. O Espiritismo nos direciona ao conceito de equidade. Porque somos Espíritos criados de forma igual, filhos de um mesmo Pai.

Pela Lei de Conservação, ensina-nos o Espiritismo ser cabível a busca pelo necessário ou fundamental, mas não pelo supérfluo. Mas, como ensina a resposta ao item 716, de “O livro dos Espíritos”, o homem em geral é insaciável. Por isto, os chamados “conservadores endinheirados” são os primeiros a defender a não-mudança, a estagnação, a manutenção do status quo. Estes desejam que tudo continue mesquinho, pequeno, desde que se mantenha a conservação de seus bens, desde que continuem a exalar o poder por conta daquilo que se possui.

Isto tudo em um mundo cíclico, como é a figuração filosófica do rio de Heráclito: o rio muda o tempo inteiro. Esta mudança deveria destinar os homens a repensarem suas atitudes em relação a si mesmos, ao semelhante, ao planeta. Em relação a este último, a Terra não é, para a humanidade, uma eterna e inesgotável fonte de extração, a ser explorada até a exaustão. Cada um de nós, Espíritos encarnados, fazemos parte de uma engrenagem precisa, que o Universo (Deus) nos permite a oportunidade de usufruir. Mas, também, de preservar. Desde que o mundo é mundo, tudo muda. Mudou, mesmo, e vai continuar mudando, como um rio que não para.

Na simbologia de uma tamareira que leva anos para dar frutos, entendemos que os que as plantam não comem de seus frutos. É fato que, pelo progresso da engenharia genética e da ciência aplicada à agricultura, hoje em dia uma tamareira já não leva mais cem anos para produzir frutos, mas dez. Num mundo como o nosso, da atualidade, em que se produz alimentos para alimentar mais de três bilhões de pessoas, paradoxalmente, um bilhão de encarnados ainda passa fome. Entre o necessário e o supérfluo, quem está na frente nessa corrida desigual?

Precisamos, por fim, conservar o planeta, a natureza, no sentido de preservação e, ao mesmo tempo, caminhar para o novo, sem o saudosismo barato do argumento conservador, que diz: “Bons tempos que se foram, agora tudo mudou!”.

Acesse o conteúdo:

A Nova Ética Espiritual a partir da Lei de Conservação, por Marcelo Henrique e Cláudia Jerônimo

Conservar, por Maria Cristina Rivé

Valorização da Vida Humana, por Rubens Policastro Meira (in memoriam)

Ecologia e Espiritismo, por André Trigueiro

Educação Espírita e Desenvolvimento Sustentável, por Orlando Villarraga

Aspectos jurídicos e espíritas nas questões socioambientais, por Cynthya Michelin Locatelli

Os avanços da Biologia perante o Espiritismo, por Jorge C. Daher

Conservação ou Conservadorismo, por Débora Nogueira

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