Galileu da Galileia, por Marcus Vinicius de Azevedo Braga

Tempo de leitura: 3 minutos

Marcus Vinicius de Azevedo Braga

***

A ciência desvela a realidade, que se impõe por vezes sem pedir licença às nossas crenças, algumas delas fundamentadas nos nossos medos e em desejos de poder.

***

Perto de completar 50 anos, a música de 1975 do cantor e compositor Jorge Ben (hoje Benjor), “Caramba!… Galileu da Galileia”, é uma obra prima de criatividade, misturando a figura de Jesus com outro personagem histórico, Galileu Galilei (1564-1642), estudioso italiano que sofreu a perseguições dos seguidores do outro Galileu já citado.

Sim, prezados leitores, com base em suas observações astronômicas, nos idos de 1600, Galileu Galilei defendia uma terra redonda e que girava em torno do sol, o que o levou a ser perseguido pela inquisição, sob a acusação de estar promovendo uma  reinterpretação da Bíblia, uma heresia, o que o levou à situação de ter que se defender no Vaticano.

Consta no aspecto mítico desse episódio que, ao se defender das acusações, temendo pela sua vida e de sua família, ele se retratou de sua teoria de que a Terra se movia ao redor do Sol, e na defesa supostamente murmurou a frase “E ainda assim ela se move” (E pur si muove).

Passados mais de quatro séculos desses acontecimentos, com o homem tendo chegado à lua e colocado telescópios em órbita, desvendando a imensidão do universo, os discípulos do Galileu da Galileia ainda perseguem os seguidores do pai do método científico, o Galileu da Itália, e muitos desses perseguidores ainda se declaram seguidores do eminente francês que cunhou a revolucionária expressão da fé raciocinada.

Espíritas com um pensamento anti científico é a realidade que se vê em falas e escritos, o que choca tanto quanto lermos, hoje, nos livros, os absurdos da Inquisição perseguindo os que defendiam a tese do heliocentrismo, por contrariar escritos da bíblia interpretados de forma literal, considerando que ali jazia um livro sagrado e atemporal.

Na verdade, não há nada na Doutrina Espírita, nas obras de Allan Kardec, e em tudo de sério e razoável que se escreveu a partir disso, que legitime um pensamento anti científico, não baseado em evidências, na razão ou em teorias consistentes. Aliás, nem nas palavras de Jesus se vê algo nesse sentido. O Espiritismo tem um marcante caráter científico e dialoga com as descobertas e com o progresso, desde a sua gênese.

Afinal, no Espiritismo se estuda, se debate, se questionam fenômenos e ideias. Esse é o legado Kardequiano que fez da doutrina forte e resiliente, livre de manipulações, sendo ao mesmo tempo revolucionária, como foi Galileu Galilei, a destronar a empáfia dos homens no centro do Universo, em um pensamento que alimenta ideias que ainda se perpetuam por aí, como de Jesus ser Deus, as vezes adaptadas até na visão espírita.

A ciência desvela a realidade, que se impõe por vezes sem pedir licença às nossas crenças, algumas delas fundamentadas nos nossos medos e em desejos de poder. Ainda que acreditemos em algo diferente, a terra se move ao redor do sol, e não são ameaças e fogueiras inquisitórias que derrubam a realidade, realidade essa que o Espiritismo se propõe a interpretar em bases mais sólidas.

Não por outra razão, no Capítulo I de “O evangelho segundo o Espiritismo”, tem-se que:

“A Ciência e a Religião são as duas alavancas da inteligência humana: uma revela as leis do mundo material e a outra as do mundo moral. Tendo, no entanto, essas leis o mesmo princípio, que é Deus, não podem contradizer-se. Se fossem a negação uma da outra, uma necessariamente estaria em erro e a outra com a verdade, porquanto Deus não pode pretender a destruição de sua própria obra. A incompatibilidade que se julgou existir entre essas duas ordens de ideias provém apenas de uma observação defeituosa e de excesso de exclusivismo, de um lado e de outro. Daí um conflito que deu origem à incredulidade e à intolerância.”

Ai, ai, caramba, diria Jorge Benjor, diante da realidade de que, ao contrário do Galileu da Galiléia, do Galileu da Itália e do Kardec da Gália, o pensamento anti científico, não libertador, insiste em ocupar as falas no Século XXI, inclusive nas fileiras espíritas, demonstrando que a absorção da beleza dessa doutrina, revolucionária ainda hoje, se deu apenas no campo da superfície, faltando ainda o devido aprofundamento desta em nossos corações.

Imagem de Dorothe por Pixabay

IMAGEM

Written by 

Postagem efetuada por membro do Conselho Editorial do ECK.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.