O conceito de Deus, por Nelson Santos

Tempo de leitura: 3 minutos

Nelson Santos

“Deus é a inteligência suprema, causa primeira de todas as coisas.”

A aristotélica resposta da Espiritualidade dada a Kardec à questão primeira permite fugir à antropomorfização, faz despertar a conceituação desse Ser Superior. A resposta primeira remete-nos aos pensadores, aos quais, o ser, segundo a metafísica, é aquilo que é, ou que existe e, sendo assim, ele é tanto atributo como existência.

Nas conceituações filosóficas, sobre Deus, temos Heráclito que introduziu a ideia do movimento e Parmênides que introduziu a ideia do ser, mas foi com Aristóteles quem iniciou a discussão em torno do problema do ser: o “ser como ser” pode ser interpretado de duas maneiras, na primeira, o ser é o comum a todos os entes; na segunda, o ser é o ser superior a todos e o princípio de todos.

Na concepção aristotélica, parte do movimento observado na natureza para buscar, identificar a causa primeira ou primeiro motor, “tudo o que ocorre, ocorre a partir de algo”, que “é mister que todo o movido se mova a partir de algo”, afirma que não há movimento sem causa, ou “o que ocorre, ocorre por algo”, e refere-se assim à noção de substância. Ser substância significa ser princípio das modificações, analogamente ao pensamento aristotélico, na resposta dos Espíritos à questão quatro, de “O livro dos Espíritos” feita por Kardec encontramos:

“O Universo existe; ele tem, portanto, uma causa. Duvidar da existência de Deus seria negar que todo efeito tem uma causa, e avançar que o nada pode fazer alguma coisa”.

Na Doutrina Espírita o ser superior a todos é Deus, diferenciado de todos os seres como o Ser. O sentido atual de substância é o de essência dos seres. Para a Filosofia Espírita Deus é “substância primeira”, mas, para compreendê-lo na sua essência, há que se lhe conferir atributos, ou qualidades, sem os quais Ele não seria o que é. Ao indagar os princípios primeiros ou supremos e as causas, busca-se aquilo que é responsável pela existência, por toda a realidade de alguma coisa. A substância é o fundamento da realidade e do conhecimento: é o que faz haver ser, o princípio ontológico; é o que vem antes de todos os seres, o princípio lógico; e o que permite haver ciência dos seres, o princípio epistemológico. Com estes princípios, para a Doutrina Espírita, Deus, substância e essência, é o fundamento de toda a realidade, o que vem antes de todos os seres.

Herculano Pires exemplifica:

“Na Filosofia Espírita o conceito do ser abrange todas as categorias “daquilo que é”, concordando, portanto, com o pensamento filosófico antigo e moderno”.

Allan Kardec, ao codificar a Doutrina dos Espíritos, coloca já no primeiro capítulo de “O Livro dos Espíritos”, na questão quatorze, apresentada aos Espíritos, insiste numa definição sobre Deus, ao que os Espíritos lhe respondem:

“Deus existe, não o podeis duvidar, e isso é o essencial”.

Em “A Gênese, Os Milagres a as Predições Segundo o Espiritismo”, item oito do capítulo II, o problema é colocado de forma clara, ressaltando a relatividade do entendimento humano, ao dizer que:

“Não é dado ao homem sondar a natureza íntima de Deus. Temerário seria aquele que pretendesse levantar o véu que a oculta de nossos olhos, falta-nos ainda o sentido que se adquire pela completa purificação do Espírito. Porém, não podendo penetrar em sua essência, mas tendo em premissa sua existência, podemos, pelo raciocínio, chegar ao conhecimento de seus atributos necessários, porque, vendo o que ele não pode, absolutamente, ser, deduzimos o que ele deva ser”.

Essa afirmação é a própria expressão do método adotado por Kardec na codificação da Doutrina Espírita, pela razão, chegando à causa, através da observação e da análise dos efeitos, sobretudo na questão treze e nos comentários do capítulo primeiro de “O Livro dos Espíritos”. Nisso, o pensamento espírita e o aristotélico guardam similitudes, poderíamos, pois, acrescentar a esses os chamados atributos entitativos ou metafísicos:

“substância ou essência: Deus é, como Ser único, objeto da metafísica, imóvel, imaterial;
do que é real podemos predicar a qualidade: Deus é bom, inteligente, justo;
do que é real podemos predicar também o muito, o pouco, isto é, a quantidade: seus atributos são infinitos, não suscetíveis de aumento nem de diminuição;
quanto ao lugar, é um Ser onipresente;
quanto ao tempo, é um Ser eterno;
quanto à ação é um Ser onipotente;
quanto à relação com outros seres é supremo ou soberano.”

Embora, com a fé raciocinada compreendemos à luz do pensamento e através dos ensinamentos dos Espíritos o que Kardec nos coloca, como livre pensadores, temos o gérmen do saber, do amor pelo saber, caracteres de nossa jornada evolutiva, na busca de melhor compreender a inteligência que denominamos – Deus, o primeiro motor ou causa primeira, que projetou o incomensurável mecanismo que é o Universo.

Fontes:

ARISTÓTELES. “Metafísica”. Trad. Edson Bini. São Paulo: Edipro, 2012.
CHAUÍ, Marilena. “Introdução à História da Filosofia: Dos pré-socráticos a Aristóteles”. São Paulo: Brasiliense, 1998.
GARCIA YEBRA, Valentin. “Metafísica de Aristóteles”. Madri: Editorial Gredos, 1998.
KARDEC, Allan. “O livro dos Espíritos”. Trad. José Herculano Pires. São Paulo: Lake, 1985.
KARDEC. Allan. “A Gênese: os Milagres a as Predições Segundo o Espiritismo”. Trad. Carlos de Brito Imbassahy. São Paulo: Feal, 2018.
PIRES, José Herculano. “Introdução à Filosofia Espírita”. São Paulo: Feesp, 1993.

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