Novos Ares para o Espiritismo, por Lucas Sampaio

Tempo de leitura: 3 minutos

Lucas Sampaio

Após a desencarnação de Kardec, um grave desvio de rota levou à desfiguração e no desvirtuamento da Doutrina e do movimento espírita. Hoje, a partir de documentos e estudos comparativos, os espíritas de todo o mundo podem acessar a verdadeira história do Espiritismo, como também auxiliar no resgate de seus verdadeiros princípios.

Não é necessário muito esforço para se constatar as enormes diferenças existentes entre o Espiritismo na atualidade e aquele do tempo de Allan Kardec. Espíritas mais atentos sentem que, desde que desencarnou o Prof. Rivail, houve um grave desvio de rota que culminou na desfiguração e no desvirtuamento da Doutrina e do movimento espírita. Para nossa surpresa, acontecimentos recentes vieram apontar para um novo horizonte, no qual a proposta espírita redescobre seu significado original e reencontra toda sua força.

Marco fundamental desse processo é a obra “Revolução Espírita”, de Paulo Henrique de Figueiredo, que revela o esquecido contexto cultural em que surgiu o Espiritismo. Tratava-se de um movimento que, dentro da universidade na França, produziu uma psicologia experimental espiritualista e um Espiritualismo Racional que vieram a constituir o pensamento oficial durante a primeira metade do século XIX naquele país, favorecendo o surgimento da Doutrina Espírita. Essas denominadas “ciências filosóficas”, que afirmavam o Homem como uma alma encarnada, adotavam o que Kardec denominava “moral da liberdade”, hoje conhecida como “moral autônoma”.

Era uma contraposição aos sistemas de moral heterônoma do dogmatismo religioso e do materialismo científico, que consideram que os atos humanos são determinados exclusivamente por fatores externos, como punições e recompensas, dor e prazer. Através dos milênios, esses sistemas, em suas mais diferentes manifestações, produziram as estruturas de privilégios e dominação social através da obediência passiva, da competição e do uso da força, anulando as capacidades do Homem e tornando-o submisso.

Por outro, a moral autônoma, levada pelo Espiritismo às suas últimas consequências, apresenta o Ser liberto daquelas antigas amarras ao ensinar que cada um traz em si mesmo os elementos de sua própria felicidade ou infelicidade futura e os meios de adquirir uma e de evitar outra, trabalhando em seu próprio adiantamento. Para o Espiritismo, as faculdades da alma (razão, consciência, vontade e livre-arbítrio) são conquistas evolutivas do Ser que permitem o gradual conhecimento das leis da alma, desde que o Espírito surge, simples e ignorante. Aos poucos, elas permitem ao Homem estabelecer sua responsabilidade, e demonstram-lhe onde está seu verdadeiro interesse. Os sofrimentos não são mais compreendidos como castigos, mas como oportunidades de progresso. O ato do dever, livre, voluntário e consciente, é o meio de conquistar gradualmente a felicidade, e a caridade não é mais uma palavra vazia.

Esses conhecimentos são as verdadeiras pedras de toque que permitirão ao espírita não somente compreender melhor diversos ensinamentos dos Espíritos, como também entender a efetiva força da Doutrina no sentido de superar o desânimo e promover uma verdadeira revolução moral na Humanidade por meio da liberdade e da cooperação, sobre as quais se poderá construir um sólido edifício social, em oposição aos falidos sistemas de salvação através de práticas supersticiosas ou de utopias políticas.

Esse fundamental movimento de restabelecimento da Doutrina ganhou grande impulso com a denúncia da adulteração de “A Gênese”, de Allan Kardec, pelo inestimável trabalho da diplomata e pesquisadora Simoni Privato Goidanich, na obra “O Legado de Allan Kardec”. Esse livro, que já nasceu um clássico, teve o mérito de combinar, com profundidade, a análise histórica, jurídica e doutrinária das questões envolvidas, permitindo que órgãos espíritas no Brasil e em todo o mundo adotassem a edição original de “A Gênese”, com a mensagem da moral autônoma.

Documentos do acervo de Canuto Abreu, isto é, centenas de manuscritos originais de Allan Kardec, têm sido divulgados ao público para permitir aos espíritas não somente descobrir a verdadeira história do Espiritismo, como também auxiliar no resgate de seus verdadeiros princípios [B].

A atual geração de espíritas é chamada a integrar esse irresistível movimento progressivo para revisitar e ressignificar antigos conceitos e levantar ainda mais alto a bandeira do Espiritismo, para que todos possam avistá-la e seguir sua mensagem libertadora!

Notas do ECK:
[A] Artigo originalmente publicado no site do Teatro Espírita Leopoldo Machado (Telma).
[B] Referidos documentos – o acervo de Canuto de Abreu – foi disponibilizado, em 2018, à Fundação Espírita André Luiz (FEAL) criou o Centro de Documentação e Obras Raras (CDOR) que lançou o projeto “Cartas de Kardec”, com o objetivo de garantir a preservação do material que guarda a memória do Espiritismo – cerca de 740 manuscritos (textos de Allan Kardec, Amélie Boudet, Gabriel Delanne e Camille Flammarion), onde Kardec, principalmente, revela bastidores, a intimidade e a verdadeira história do Espiritismo sendo, ainda, possível, conhecer o lado humano, pessoal e familiar do Professor Rivail. Posteriormente, em parceria com a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), os documentos estão sendo preservados, traduzidos e logo, o conteúdo total estará à disposição da comunidade espírita internacional e de outros interessados, não-espíritas, para suas pesquisas.

Imagem de Zaccaria Boschetti Pixabay

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Postagem efetuada por membro do Conselho Editorial do ECK.

One thought on “Novos Ares para o Espiritismo, por Lucas Sampaio

  1. Visto estarmos no olho do furacão espírita, por vezes não nos apercebemos a importância sísmica necessárias a impulsionar-nos ao progresso. Assim este artigo vem-nos como um alento. É certo que distante, fazendo a curva; mas o que é o tempo aos espíritos?

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