A Pandemia e a quebra de Paradigmas Espíritas, por Edson Figueiredo de Abreu

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Como sabemos, a pandemia provocada pelo Covid-19 impôs à sociedade como um todo um inesperado isolamento social, mantendo em funcionamento restrito apenas as atividades consideradas essenciais, tais como farmácias, mercados, postos de gasolina, etc.

Seguindo determinações governamentais municipais e/ou estaduais, os Centros Espíritas, visando auxiliar neste processo de contenção do virus, também aderiram ao isolamento, interrompendo provisoriamente suas atividades presenciais e fechando suas portas ao atendimento público e as reuniões privadas, inclusive as chamadas reuniões mediúnicas.
Naturalmente que esta situação de quarentena forçada não era esperada por ninguém e nenhum dirigente espírita, por mais precavido e informado que fosse, poderia prever esta inusitada situação de permanecer, por mais de um ano, de portas fechadas.

Sem as atividades presenciais por longo período, muitas Casas Espíritas sofreram as consequências materiais e financeiras provocadas por esta situação. Algumas delas, infelizmente, já encerraram definitivamente suas atividades e outras ainda estão sofrendo as consequências do isolamento prolongado, tendo seu patrimônio depredado, roubado ou deteriorado por falta de manutenção ou procedimentos de vigilância.

Muitos voluntários espíritas, habituados que estavam em exercer suas atividades presencialmente nos centros espiritas, ficaram assustados, perdidos e sem direção, como um barco à deriva, sem saberem muito bem o que fazer do seu tempo vago. Neste sentido, os que mais sofreram a falta da atividade presencial foram os médiuns, muitos inclusive, esquecidos da sua verdadeira condição – a de que tais são médiuns 24 horas por dia e não somente nos dias e horários em que colaboravam nas reuniões mediúnicas.

É certo que a pandemia proporcionou inúmeras lições individuais e coletivas e muitas considerações sobre este tema ainda serão tecidas ao longo do tempo. Porém, o que abordaremos neste artigo é a questão da quebra de alguns “paradigmas espiritas”, principalmente relacionados à suspensão das atividades mediúnicas, atendimento fraterno, cursos e reuniões públicas, além do polêmico assunto “o equilíbrio dos médiuns”.

O primeiro paradigma quebrado é o da questão da necessidade presencial para a realização de reuniões de estudos e cursos doutrinários. São inúmeras as casas que, a partir do início da pandemia, adotaram reuniões e cursos online, se valendo de diversas ferramentas tecnológicas disponíveis. Há relatos, inclusive, do aumento de público nos cursos virtuais, com a participação de alunos de outras localidades, estados e mesmo outros países. Até expositores que estão residindo fora do Brasil voltaram a dar aulas, graças aos recursos tecnológicos adotados. Alguns dirigentes, inclusive, têm opinado que os cursos espíritas virtuais são um caminho sem volta e seguirão com os mesmos, mesmo com o retorno às atividades presenciais, mesclando, assim, aulas virtuais e presenciais.
Outro paradigma superado é o de que as reuniões públicas de palestras e passes precisariam ser presenciais, já que elas passaram a ser feitas, também, de forma virtual. É impressionante o número de lives que “pipocaram” nas redes sociais, como o Facebook e o Instagram, além de canais do YouTube. Muitos centros espíritas promovem, além das palestras, o passe virtual.

Até o atendimento fraterno, que sempre foi feito de forma presencial, ganhou um formato virtual. São várias as casas que adotaram, com relativo sucesso, o chamado “atendimento fraterno online”, utilizando ferramentas como o Skype, Google Meet, Zoom, Microsoft Teams, etc. Como nos cursos, esta modalidade de atendimento ampliou a capacidade de acolhimento, sobretudo para pessoas que residem em localidades distantes. Também aqui, alguns dirigentes dizem que irão manter o “atendimento fraterno online” mesmo com o retorno das atividades presenciais, no pós-pandemia.

Muitas casas espíritas também adotaram o chamado “grupo mediúnico virtual de vibrações”. Os médiuns são, então, interligados à reunião via internet por meio de diversos aplicativos, como os mencionados acima. Tais grupos realizam o atendimento à distância de pessoas cujos dados são captados nos próprios sites das instituições e/ou no atendimento fraterno online. Esta é uma interessante e diferente forma de manter o médium em permanente atividade, quebrando outro paradigma, o da necessidade da reunião presencial. Aproveita-se, também, estas reuniões para promover estudos de obras espíritas no grupo virtual.

Porém, na minha opinião, o maior paradigma modificado é aquele que se refere às reuniões mediúnicas e o pseudo equilíbrio dos médiuns sem a atividade presencial. Sem dúvida, este foi o maior desafio enfrentado pelas lideranças espíritas, que gerou e ainda está gerando algumas reflexões, a saber:
Que “fim” estão levando aqueles Espíritos desequilibrados que eram socorridos nas reuniões mediúnicas e que precisavam do chamado “choque anímico” – manifestação através do médium – para entenderem sua real situação de desencarnados?

Será que estes Espíritos estão todos aguardando, em sofrimento, a quarentena acabar e as casas espíritas voltarem ao normal para serem socorridos?

Será que, independentemente da casa espírita e do papel do médium no socorro, não existe o esclarecimento destes Espíritos no próprio plano espiritual?

Qual era o destino destes Espíritos, antes da codificação do espiritismo e antes da existência das casas espiritas? Lembrando, inclusive que, com Kardec, as reuniões eram de aprendizado e não tinham o objetivo principal de assistência e socorro, como o adotado nas reuniões espiritas do chamado “movimento espírita brasileiro”.

E os médiuns sem a atividade mediúnica presencial como ficam? Estão todos desequilibrados? Ou se adaptaram a atividade mediúnica em seus lares?

Se estão praticando a atividade mediúnica em seus lares, como fica a máxima de que isso é “proibido”, por não ser “seguro” (nem para o médium e nem aos seus familiares) no ambiente doméstico, como se cultua e repete no dito movimento?

E os médiuns que se apresentam desequilibrados? Até que ponto o desequilíbrio é por falta da atividade mediúnica, e até que ponto ele é decorrente do isolamento social, que gerou desequilíbrio em tantas outras pessoas, sendo que estas últimas nada conhecem sobre mediunidade nem são médiuns ostensivos?

Será que, em seu lar, através do estudo da doutrina ou através do estudo online com os companheiros do grupo mediúnico, o médium também não consegue manter o equilíbrio e até atuar mediunicamente?

Estas questões e muitas outras necessitam ser esclarecidas no movimento espírita brasileiro, através de um amplo e sério debate. Isso, porém, vai requerer desapego dos dirigentes e muita racionalidade na discussão dos temas, com isenção de paixões, convicções e interesses próprios (ou de entidades representativas). Condições estas que, a meu ver, ainda estamos distantes de conseguir vivenciar!

Por fim, esperemos com serenidade e equilíbrio o futuro retorno à normalidade, para saber qual será o comportamento do movimento espírita. Lamentavelmente, eu aposto na volta ao “status quo” anterior a paralisação, com as costumeiras práticas e crendices, desconsiderando completamente as questões apresentadas neste artigo.

E você leitor, o que acha? O tempo dirá!

E D I T O R I A L: Perante a pandemia

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Postagem efetuada por membro do Conselho Editorial do ECK.

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