Célia Aldegalega, de Portugal
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Quantas sequelas traumáticas de ter sido mulher transporta o Espírito da mulher que é espírita? Dessas experiências lhe virá a resiliência, impulsionando-a a ser feminista num mundo ainda marcado por desigualdades de género, mesmo nos países mais adiantados. Ainda assim, se viesse a desencarnar neste momento, preferiria reencarnar como mulher novamente, a fim de continuar o trabalho.
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Nesta encarnação o Espírito espírita que é mulher, sabe que foi, mas não se lembra, de ter sido mulher noutras encarnações. Quantas outras? Pergunta-se ocasionalmente, sabendo que é improvável obter essa informação enquanto encarnado. Aliás, informação de pouca utilidade, a não ser para adubar o ego e arriscar fragilizar-se à influência de Espíritos dispostos a tirar partido da sua presunção curiosa.
O Espírito que é mulher espírita detesta vestidos de noiva desde tenra idade. Recusou-se a fazer a comunhão solene, porque teria de vestir um vestido “de noiva”, ou um traje de noviça, e deixou de frequentar a Igreja porque o padre se enfureceu quando lhe disse que Deus não queria saber do que ela vestia. Foi insolente e rude, quando a prima que se casava lhe disse que iria emprestar-lhe o vestido para o seu casamento: “Nem morta vou vestir uma coisa dessas!” (e a declaração abrangia vestido e casamento, e foi cumprida).
Muitos anos depois, passeando na zona das Portas do Sol, em Madrid, a filha criança deteve-se diante da montra [1] de uma loja de vestidos de noiva. Não sabe que expressão facial levou a filha a perguntar-lhe: porque detestas vestidos de noiva? A mulher respondeu que os achava kitsch [2], mas a espírita suspeita de trauma associado, em que visualizar os vestidos seja um gatilho (no sentido da Psicologia). O Espírito arquivou, com certeza, quantos casamentos forçados e quantas existências infelizes pode, um vestido de noiva, simbolizar.
Quantas sequelas traumáticas de ter sido mulher transporta o Espírito da mulher que é espírita, e aqui escreve? Dessas experiências lhe virá a resiliência, impulsionando-a a ser feminista num mundo ainda marcado por desigualdades de género, mesmo nos países mais adiantados. Ainda assim, se viesse a desencarnar neste momento, preferiria reencarnar como mulher novamente, a fim de continuar o trabalho. Por todas as mulheres, atuais e futuras, espíritas ou não!
Notas do ECK:
[1] Montra é a expressão do português originário (de Portugal), correspondente à vitrine ou vitrina (Brasil), simbolizando todo espaço envidraçado de uma loja, para demonstrar objetos ou produtos que nela estão à venda. Pode se dizer que uma montra é uma interface entre o estabelecimento comercial e o consumidor ou cliente, caracterizando, assim, em geral, a “primeira impressão” que o público tem da empresa e seus produtos, estando, portanto, diretamente ligada à identidade do empreendimento contribuindo para a sua comunicação conceitual.
[2] Termo em alemão, um adjetivo que significa brega, ou sentimental, barato e até vulgar, dependendo do contexto.
Imagem de Gerd Altmann por Pixabay
Excelente articulado, a demonstrar firmeza de convicções. Eu, de minha parte, pensei em iniciar na próxima encarnação a criativa experiência de ser mulher.