O Espiritismo fortalece a Religião sem ser Religião. Por quê?, por Marcelo Henrique

Tempo de leitura: 4 minutos

Marcelo Henrique

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“O Espiritismo é uma doutrina moral que fortalece os sentimentos religiosos em geral e se aplica a todas as religiões; ele é de todas, e não é de nenhuma em particular; por isso não diz a ninguém que a troque; deixa a cada um livre para adorar Deus à sua maneira e para observar as práticas que sua consciência lhe dita, pois Deus leva mais em conta a intenção do que o fato”.

Allan Kardec (“Revue Spirite”, fevereiro de 1862, “Resposta à mensagem dos espíritas lioneses por ocasião do Ano Novo”. Nossas marcações.).
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Acordo, todos os dias, e ligo o meu telefone celular. Nele, comumente, estão mensagens dos amigos que cultivei nestes últimos anos. Muitos deles, logicamente, são espíritas, porque a atuação em atividades da Filosofia Espírita me pôs em contato com muitas pessoas, também declaradamente espíritas.

Delas recebo, então, mensagens, textos, artigos, links e tudo o mais, da mesma forma como, reciprocamente, também lhes envio sobretudo as “produções” do nosso “Espiritismo COM Kardec – ECK”.

Hoje, pela manhã, o meu querido amigo, atento e dedicado estudioso espírita, Sérgio Thiesen, me enviou esta frase que abre este singelo ensaio. Ela foi dita, não pelos Espíritos que trabalharam lado a lado com Kardec, mas pelo próprio Professor. Há que se dizer – para os que ainda não sabem ou para os que intentam diminuir a grandeza do responsável pela existência da Filosofia Espírita – que ele, Rivail, é o grande arquiteto, costureiro, engenheiro, filósofo ou jurista da Doutrina dos Espíritos.

Ainda que muitas informações, em suas 32 obras, venham por meio da mediunidade, em textos psicografados (à sua frente, na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas, o primeiro centro espírita do mundo, que ele fundou, como enviadas por carta, dos mais diferentes lugares, entre 1857 e 1869), é literária e autoral a obra espírita como de Allan Kardec. E isto está manifestamente comprovado – além das infinitas perguntas contidas em várias de suas obras – como nos textos expressos em comentários, introduções, conclusões, notas explicativas e, mais destacadamente, em itens inteiros (como, exemplificativamente, o “Resumo Teórico sobre o Móvel das Ações Humanas”, no item 872, de “O livro dos Espíritos”.

A autoridade intelectual de Kardec como o legítimo “inventor” da Filosofia Espírita – contando com o “apoio” (participação) de inúmeras Inteligências Invisíveis, que lhes forneceram interessantes digressões sobre as questões espirituais – não pode ser negada nem minimizada.

Voltando ao texto introdutório deste artigo, contido na “Revue”, vemos toda a capacidade e a visão plural e ampliada de Kardec para entender que o Espiritismo poderia complementar as teorias já explicitadas pelas religiões em geral – ocidentais ou orientais – todas elas sustentadas em “revelações sobrenaturais” e, por isso, eivadas de tons místicos ou mitológicos, ao mesmo tempo em que se fundamentam em dogmas (verdades irreais, calcadas em “mistérios da fé”).

Nele, Rivail apresenta a Filosofia Espírita como o arcabouço teórico-prático que visa desconstituir elementos irracionais ou desprovidos de lógica racional, como, por exemplo, as teorias de Adão e Eva (Criação do elemento humano), da Trindade (Deus Pai, Filho e Espírito Santo), da virgindade e do corpo não-material de Jesus, da ressurreição (recomposição do corpo morto e inerte), entre muitas outras.

Mas, ao contrário do que possa, à primeira leitura, parecer ou significar, o Espiritismo não sepulta(rá) nenhuma religião sobre a face da Terra, nem será o que, ufanisticamente, muitos espíritas imaginam e desejam (“o futuro das – todas – religiões). Não. O próprio Kardec afirmou em alguns textos que os indivíduos poderiam conservar suas crenças (pessoais, familiares, sociais, tradicionais) e estudar (e se convencer) a realidade espiritual-espírita. É por isso que temos muito mais SIMPATIZANTES do que ADEPTOS (aqueles que se afirmam como) ESPÍRITAS.

O texto do discurso de Kardec – que pode ser lido, na íntegra, no fascículo de fevereiro da “Revue” – deve ser convenientemente entendido e estudado, inclusive por aqueles que insistem que o Espiritismo “seja uma religião” (ainda que filosófica, lembrando outro discurso de Rivail, por ocasião da “Sessão Anual Comemorativa dos Mortos” – “Revue Spirite, dezembro, 1868, que tem como subtítulo “O Espiritismo é uma religião”?).

O que mais vemos – por aí, por aqui (ECK) e alhures – são pessoas ainda APEGADAS à necessidade de TER uma religião, ou de substituir a sua religião tradicional (de formação pessoal, de influência familiar ou de amizade, de cultura, de ensino tradicional, ou a partir das buscas de cada um) pelo Espiritismo.

Não, meus amigos! Kardec JAMAIS pretendeu fazer com que EXISTISSE uma religião espírita nem que as pessoas deixasse sua identidade religiosa para assumir a frequência em ambientes espíritas – como se fossem igrejas ou templos. Embora, é claro, a grande maioria dos que vão aos centros espíritas encare as reuniões (públicas) como “missas” ou “cultos”. E isto não se deve a Kardec, mas ao sincretismo religioso presente na sociedade brasileira – desde o início do século XX – e, fortemente, AQUILO QUE AS PESSOAS VÃO BUSCAR nos centros.

Distante desta “atmosfera” e “realidade” convém retornarmos ao pensamento original (Legado de Kardec) para afastar o religiosismo exacerbado e a postura igrejeira (lembremos que Herculano Pires sempre combateu) vigentes em grupos e instituições espíritas. E, em assim procedendo, NÃO ESTAMOS DESVALORIZANDO ou AFASTANDO a RELIGIOSIDADE (ESPIRITUALIDADE) de ninguém. Pelo contrário. Como Kardec asseverou, cada qual que VIVA A SUA RELIGIOSIDADE (ESPIRITUALIDADE) de MODO ÍNTIMO, sem a necessidade de qualquer exteriorização (cultos, ritos, posição subalterna, adoração de Espíritos, Médiuns, Expositores ou Dirigentes, e o comportamento de entender e substituir as “partes” de uma “missa” ou “culto” pelas vigentes nas reuniões espíritas: abertura, prece, palestra, prece, passe…).

Kardec, veja-se o texto destacado, assume uma postura totalmente distinta deste “Espiritismo à brasileira”. Ele afirma que o Espiritismo fortalece, porque a sua teoria explica de modo NATURAL, LÓGICO e RACIONAL, os temas afetos à religiosidade. E interpreta os temas espirituais para além do místico e do mítico.

Então, o Espiritismo não foi nem nunca será religião, conforme Kardec. Ele o é apenas para os que (ainda) dependem da bengala religiosa… Mas, um dia, eles também irão se libertar de tais bengalas…

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Postagem efetuada por membro do Conselho Editorial do ECK.

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