Inteligência: Artificial, sim. Mas e a Natural?, por Marcelo Henrique

Tempo de leitura: 5 minutos

Marcelo Henrique

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A tecnologia deve ser SEMPRE utilizada para o progresso humano-espiritual. Mas que, em face das imperfeições humanas, não é o aplicativo, a plataforma ou o equipamento o mais importante. O que deve ser “checado”, SEM EXCEÇÕES, é a origem da informação. Porque esta pode ser falsa e, em consequência, tudo o que dela decorrer também o será.

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Celeremente, numa velocidade que nem sempre conseguimos acompanhar, os inventos “modernos” tomam de assalto nossas vidas. Afinal, como (sobre)viver sem eles? Talvez seja mesmo impossível.

Na marcha do progresso – terreno (considerando que, mesmo espiritualistas, a maioria dos humanos da atualidade, se concentra no visível e no palpável, onde a ambiência planetária, material, carnal é o que mais importa) – as “facilidades” que os equipamentos e seus “aplicativos” colocam no nosso cotidiano, até nos fazem esquecer como era a vida antes…

Praticamente é o mito da caverna ao inverso. E a caverna é aqui, fora, sob a clara luz do dia, onde tudo é real, até o que parece ser. E quantos de nós, na avalanche das rotinas diárias da luta física por viver (e sobreviver, dignamente) se questionam acerca do que é verdadeiro e do que é falso?

É fato que nem tudo o que é falso (no sentido de ter sido criado artificialmente, claro!) gera prejuízos instantâneos, imediatos e quantificados (seja econômica, seja moralmente). E, então, o que é ilusório – como aquilo que a imaginação infantil “plasmava” em cenários surreais e personagens imaginários, em brincadeiras e sonhos – por vezes suplanta o que é palpável e existencial. Uma fuga? Pode ser…

Faço um recorte para ilustrar o mote que me fez redigir este ensaio: Esta semana se “descobriu” que uma banda que viralizou na internet, com dois álbuns e quase 1 milhão de ouvintes era fake, isto é, uma invenção da Inteligência Artificial (IA). O perfil no Instagram, inclusive, se valeu de imagens geradas por IA, representando os seus quatro integrantes. Durou pouco a ilusão, porque a plataforma Deezer logo fez constar uma observação “conteúdo criado com ferramentas de inteligência artificial”.

Estima-se que, atualmente, só nesse segmento, o da arte musical, um número superior a 120 mil faixas (execuções musicais, gravadas) são enviadas para plataformas como Apple Music e Spotfy, produzidas por IA e totalmente “artificiais” – no sentido de não serem performances humanas, mas imitações – muitas vezes, até superiores, pelos requisitos de perfeccionismo que estão presentes nessas plataformas.

Há problema nisso? Do ponto de vista do entretenimento, nenhum – no nosso entendimento. Uma música atrai (ou não) por seu conteúdo, performance, resultado, atraindo públicos dos mais distintos gostos e preferências. Do ponto de vista da ética – ou da verdade – todos. Afinal de contas, o ilusório não pode nem deve substituir o verdadeiro, tomando de assalto as percepções que temos acerca da própria vida (que é uma experiência sensorial e vivencial em plenitude, e não uma pseudovida).

Não somos, enquanto humanos, pois, adoradores de fantasmas ou de seres imaginários, ainda que uns e outros povoem nossos pensamentos (Espíritos), vez por outra, seja pelo uso racional da imaginação seja pelas circunstâncias derivadas das nossas próprias “alucinações”. Inspiramo-nos em seres iguais a nós e, quando esses detêm habilidades, capacidades ou talentos acima dos nossos, a idolatria é condição da natureza humana, onde o maravilhoso vira adoração, paixão e amor, em muitos casos.

Transponho essa situação acima, correlacionada à música, para outros interesses, muitos deles voltados à intelectualidade e às ocupações que fazem parte da existência de muitos, como as preferências filosóficas e as carreiras acadêmicas e profissionais.

Semana passada, em uma aula do Doutorado comentávamos sobre a utilização, em trabalhos acadêmicos stricto sensu (como o Mestrado) de conteúdos gerados por IA. Explicitamente, em uma das bancas de qualificação de Dissertação (etapa intermediária e prévia à concessão futura do grau de “Mestre” em determinada área), constatou-se que uma ou duas referências (artigos que embasavam a construção científico-literária do mestrando) jamais foram publicadas em periódicos científicos (mas continham de modo expresso e correto todos os elementos das referências, segundo os padrões técnicos). Tinham sido compostas por IA! E não foram utilizados por má fé pelo candidato, pois ele acreditou que eram reais (e não havia qualquer informação de que se tratava de um produto gerado pela IA).

E, no âmbito do Espiritismo, também tem se proliferado as “produções” geradas por IA, seja na forma de textos, plataformas de pesquisa/consulta e vídeos (estes últimos com um formato que é praticamente o da realidade material, nas imagens e sons, deixando dúvidas se é real ou produzido artificialmente o conteúdo.

Na Justiça, também, materiais que podem se constituir em indícios de prova estão sendo submetidos a procedimentos investigatórios e perícias, para que sejam descartados como fatos reais e tratados como provas fakes – e, neste caso, com a responsabilização cível e criminal pelo uso indevido e pela tentativa de subversão da realidade. Isto é muito sério!

Voltando ao “habitat” espírita, devemos dizer que a tecnologia deve ser SEMPRE utilizada para o progresso humano-espiritual. Mas que, em face das imperfeições humanas, – e, neste ponto, sobressai os interesses de vários matizes que os humanos possuem, inclusive o de serem enaltecidos e agraciados por poder, fama e honra em relação a seus “produtos” ou “ações” – não é o aplicativo, a plataforma ou o equipamento o mais importante. O que deve ser “checado”, SEM EXCEÇÕES, é a origem da informação. Porque esta pode ser falsa e, em consequência, tudo o que dela decorrer também o será.

Imaginemos que você esteja em frente a um instrumento de pesquisa gerado por IA em que pode buscar informações (nas obras de Allan Kardec) sobre um determinado tema ou assunto. Basta digitar no campo propício, um ou mais termos, que logo o prompt irá gerar uma relação de todos os trechos em que a temática aparece, em textos “de Kardec”.

O neófito (ou nem tanto!) bastante entusiasmado (rica expressão cunhada pelo filósofo Herculano Pires, na década de 1960) para se referir aos espíritas invigilantes, desatentos e maravilhados em demasia com as informações espirituais-espíritas, já vai utilizar e reproduzir aquilo que a “plataforma” lhe informou sobre o Espiritismo. E, por extensão, irá se converter num meio de propagação de… inverdades!

Porque raros são os que irão comparar o resultado gerado por IA com o material originário – neste caso a edição ORIGINAL e AUTÊNTICA da obra em que a informação se baseia, porque há, infelizmente, textos adulterados e, também, traduzidos equivocadamente para o português, com imperfeições que prejudicam a real compreensão do conteúdo original.

A IA é, pois, uma realidade presencial e permanente – porque veio para ficar. No entanto, ela não pode (nem poderá, jamais) substituir o que é natural pelo que é artificial. Em outras palavras: que você, leitor, não subestime a sua própria inteligência e não a descarte para confiar em outra inteligência, “tida como superior”, mas que, como todas as coisas que a materialidade comporta e contém, pode ser totalmente inferior. As “coisas” em si são – e sempre serão – neutras, em sua essência. O uso que as empregarmos é que estabelecerá a divisão entre o útil e o inútil, o bom e o ruim, o verdadeiro e o falso.

Pense nisso!

Imagem de Fabricio Macedo Fabrício por Pixabay

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Postagem efetuada por membro do Conselho Editorial do ECK.

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