Cláudio Bueno da Silva
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Talvez precisemos retomar algumas esquecidas práticas no campo da convivência, correlacionadas à colaboração e à experiência de todos e de cada um em particular, na busca do bem estar físico e mental.
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O ser humano para progredir é chamado a viver em sociedade [1], e seu isolamento social e cultural, desde que voluntário, reflete apenas o ato egoísta de pensar só em si e uma pretensa superioridade sobre os outros.
“O meio natural de evolução – diz Herculano Pires –, para o homem e para todas as coisas e todos os seres, é a relação” [2].
Voltando a Kardec [3]: “O homem deve progredir, mas sozinho não o pode fazer porque não possui todas as faculdades; precisa do contato dos outros homens. No isolamento ele se embrutece e se estiola”.
A experiência que faz amadurecer a alma flui mais autêntica e eficiente nas relações interpessoais. O homem precisa do homem para aprimorar o sentimento e desenvolver a inteligência, e para isso é necessário o contato direto, o calor da palavra, a permuta de energia e conhecimento entre as pessoas nas relações objetivas da vida material.
Porém, as características do mundo atual – tecnológico, fingido e egoísta – têm feito as pessoas buscarem alternativas de convivência que acabam se opondo aos seus verdadeiros interesses naturais. A violência e o medo na vida moderna (mas não só isso) estão afastando cada vez mais umas das outras, forçando-as a se relacionarem por vias artificiais, hoje fartamente disponíveis.
Cercadas por grades e sistemas de segurança, fechadas em seus condomínios, apartamentos, casas e escritórios, sentem-se possivelmente mais seguras, mas acabam concorrendo compulsoriamente para o aumento do mal social, o isolacionismo.
O vai e vem condicionado e seletivo dos shoppings, o confinamento dos membros da família, cada um no seu cômodo, os incontáveis guetos religiosos que se isolam em pequenos (ou grandes) rebanhos que não se afinam uns com os outros. Tudo isso contribui para que as pessoas se afastem da vida real.
Os conflitos humanos se resolvem, preferencialmente, através das relações de contato em sociedade. Assim também se dá o progresso individual e coletivo. Isolando-se, o homem não encontrará parâmetros. O processo de crescimento é em alguma medida individual, mas sem referências práticas externas a experiência humana será pobre e limitada. Como destaca Kardec [4]: “Nenhum homem dispõe de faculdades completas e é pela união social que eles se completam uns aos outros”.
A espiritualização do homem, que passa antes pela sua humanização no plano da matéria, requer compatibilidade entre suas ações e o seu desejo de liberdade e plenitude, que muitos chamam de felicidade. Isso ele conseguirá vivendo entre os homens, procurando aprender, acertar e influir positivamente.
É preciso pensar que se o homem, por força da Lei de Deus, assume o compromisso de reencarnar na Terra, estará aceitando tacitamente sua meta principal aqui: evoluir. Precisará da diversidade humana como forma de ganhar experiência e garantir a sua formação como indivíduo. A diversidade servirá de matéria de análise sobre como melhor agir nesse mundo, sobre o que aceitar e o que evitar.
Em consequência, conclui-se: assim como não dá para “se jogar no mundo”, não dá também para se encastelar no egoísmo individual ou de grupo.
A humanidade, passível de progresso, não pode prescindir da colaboração e experiência de todos e de cada um em particular na busca do bem estar físico e mental. Talvez precisemos retomar algumas esquecidas práticas no campo da convivência, reforçando-as com amor e fraternidade: as reuniões em família, as visitas, as conversas, o abraço, a gentileza, o respeito, os pequenos favores, os elogios, as “lembrancinhas” …
Não se trata de voltar ao passado, mas de enriquecer o presente e construir o futuro com emoções duráveis.
Fontes:
[1] Kardec, A. (2004). “O livro dos Espíritos”. Item 766. Trad. J. Herculano Pires. 64. Ed. São Paulo: LAKE.
[2] Pires, J. H. (1976). “Agonia das Religiões”. São Paulo: Paideia.
[3] Kardec, A. (2004). “O livro dos Espíritos”. Item 768. Trad. J. Herculano Pires. 64. Ed. São Paulo: LAKE.
[4] Kardec, A. (2004). “O livro dos Espíritos”. Comentário de Kardec, ao item 768. Trad. J. Herculano Pires. 64. Ed. São Paulo: LAKE.
Imagem de RAFAEL BRITTO por Pixabay
Edição: Junho de 2025
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