Espiritismo, Futebol e Estupro: o que isto tem a ver? Por Marcelo Henrique, Manoel Fernandes Neto e Nelson Santos

Tempo de leitura: 5 minutos

Por Marcelo Henrique, Manoel Fernandes Neto e Nelson Santos

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“Há sempre crime quando se transgride a Lei de Deus” (“O livro dos Espíritos”, item 358).
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Para um número significativo de leitores (espíritas e simpatizantes) o título deste artigo, escrito a seis mãos, provoca surpresa e, talvez, curiosidade. E é bem possível que alguns leitores, vendo a “chamada” do texto, decidam por não lê-lo. Respeitamos!

Espiritismo? Sim!
Afinal de contas, Allan Kardec, o criador (dito, também, Codificador) da Doutrina dos Espíritos, com o papel de protagonista de introdutor da Filosofia Espírita no nosso planeta, no consórcio com inúmeros Espíritos (desencarnados), não desejou nem fomentou que o Espiritismo se afastasse das duras, pungentes e lamentáveis situações do mundo de expiações e provas. Pelo contrário, inseriu a proposta espírita no cotidiano da vida, para permitir, com os “olhos espirituais” sob a interpretação espiritista, o descortinar de qualquer tema e contexto (com seus personagens, encarnados e desencarnados), adicionando elementos que fogem à visão humana e material de grande parte dos habitantes do nosso orbe.

Estupro? Sim!
Sim, vamos falar do estupro – um dos crimes mais bárbaros, hediondos e repugnantes atos, simbolizando não só a barbárie que ainda segue como característica de muitos encarnados, mas também, no caso que ocupa os meios midiáticos nestes últimos dias (e não somente ele, mas outros, anteriores), vinculados à pérfida misoginia que está presente nos homens, “machos” e, ainda, infelizmente, em (poucas) mulheres que não levantam suas vozes e seus braços em protesto.

Futebol? Sim!
Um dos esportes humanos mais populares e seguramente um dos que movimentam a maior quantia de valores e recursos financeiros por todo o planeta, que desperta amor e ódio, paixão e menosprezo, empolgação e desânimo, alegria e desespero, a partir de um simples ato de emoção de mulheres e homens e seus clubes preferidos, e que desemboca em sensações e sentimentos de inúmeros matizes.

Pois vamos falar de hipocrisia. E de falta de caráter. E de vícios morais. E de crimes. Inclusive continuados e reiterados.

Agora, hoje, é um técnico de futebol, mas “ontem” foi um jogador em fim de carreira e “anteontem” um ex-jogador. Três personagens com carreiras de sucesso, vitoriosas e, não raro, elementos que se associam à condição de ídolos do futebol brasileiro: fama, dinheiro, tietagem, louvor, glória, reconhecimento, estima, admiração. Quantas crianças e adolescentes já não se inspiraram em seus “bate-bolas” de colégio ou de amigos do bairro, ou nas “escolinhas de futebol” em ser como eles? Quantos adultos, envolvidos em suas carreiras esportivas profissionais não se espelharam em um ou mais destes três indivíduos?

Em uma fração de segundos, o castelo de cartas é derrubado, ou a escultura de areia é destruído pelas ondas do mar…

Pois a condição de animalidade inferior, em dados momentos da existência corporal se manifesta e comporta o cometimento de atos que deveriam provocar a indignação coletiva de todos os que coabitam este mundo. Imaginemos nossas mães, esposas, irmãs, filhas, amigas, colegas de trabalho, vizinhas, ou, ainda, outra mulher que nem faça parte de nossas convivências, como vítima destes atos desumanos e indignos.

Ao que parece, grande parte dos nossos “companheiros de jornada”, em regra, só valoram os atos presenciais, próximos, com os quais tenha alguma correlação ou vínculo. Quando se trata de um terceiro, nem sempre existe o sentimento de solidariedade e a comoção. E, neste quesito de “bicho-homem” ou “macho-alfa”, há muitos que ainda se comprazem e se “orgulham” (como pode!?) diante da divulgação dos crimes cometidos.

Em muitos casos, também, há a estúpida e hedionda ideia de que a vítima, mulher, tenha, de alguma forma, “contribuído” ou “concorrido” para o evento-desfecho, isto é, para o cometimento dos atos brutais e criminosos. Insolentes e igualmente bárbaros os que assim pensam ou falam (e se não falam, imaginam)…

Não há qualquer justificativa para o sexo não-consensual, seja com mulher ou homem, hetero ou homossexual, cis ou trans. Não, mesmo! Atentar contra o corpo e a sexualidade humanos é um dos crimes mais brutais que ainda permanecem em nossa sociedade. E não se sabe, infelizmente, quando irão desaparecer estas condutas do nosso cotidiano e da nossa trajetória espiritual neste planeta.

As vítimas – algumas, inclusive, vulneráveis (lembremos que vulnerabilidade é um conceito técnico-jurídico, presente nas mais avançadas legislações do nosso mundo, inclusive a brasileira, para proteger aqueles que estejam em situação de fragilidade ou incapacidade de defesa, diante de atos de outrem, pertencendo à órbita dos direitos humanos fundamentais (como a vida, a saúde, a integridade física e psicológica, por exemplo) – em grande parte das situações não possuem qualquer condição de defesa ou resistência. E é por isso que o tratamento jurídico-policial-judicial tem de ser efetivo e completo, sob pena de estarmos diante da perpetuação de injustiças e da consequente sensação de impunidade.

Pois é esta impunidade que alcança os três personagens em questão – ainda que um esteja provisoriamente preso, aguardando a conclusão das investigações e o consequente julgamento, atualmente e outro esteja em processo de efetivação da sua condução coercitiva a estabelecimento penal para cumprimento de pena, enquanto o terceiro – que é o caso que estampa as notícias midiáticas – jamais tenha sido efetivamente conduzido ao cumprimento de pena pelo julgamento ocorrido.

Louve-se, entretanto, a atitude de muitas mulheres e homens do nosso tempo – inclusive membros de torcidas organizadas, cronistas e jornalistas esportivos, ex-atletas, dirigentes e técnicos de futebol que romperam seus silêncios e têm protestado e exigido o efetivo julgamento e/ou o cumprimento de sentenças condenatórias. Em algumas situações, também, eles, os torcedores se indignaram diante da possibilidade de um dos personagens voltar a “vestir a camisa” de clubes onde atuaram e, agora, até o elenco de futebol feminino de um dos clubes protestou contra a contratação do técnico para o time masculino.

Louve-se a coragem das jogadoras de futebol de um dos maiores clubes profissionais do país, pela coragem em se manifestar, em solidariedade a uma menina de 13 anos estuprada em país estrangeiro, por jogadores de um clube nacional em excursão pela Europa! Este é um exemplo digno que mostra a perspectiva de estarmos “virando a chave” e mudando paradigmas: do silêncio à indignação ativa, à manifestação pacífica, à coerência entre discursos e práticas – e, porque não pensar, também, em espiritualização da Humanidade e progresso espiritual do planeta, como um todo.

Nós, espíritas, pelos fundamentos da Filosofia Espírita, conhecemos as categorias dos mundos habitados e estamos cientes do curso do processo – já duradouro, é verdade – de transição entre o atual estágio (expiações e provas) para o próximo (regeneração). Portanto, é possível que, com os nossos esforços, de mulheres e homens encarnados na Terra, possamos contribuir para a mudança de valores e conjunturas, sociais e legais, dentro da premissa de que são, de fato, os humanos (e não os Espíritos desencarnados) que devem envidar esforços para a construção de uma sociedade mais solidária, próspera, ética e feliz.

Até lá, ainda iremos conviver com esses tristes personagens de nossa história, que ainda se valem de suas posições de relativo privilégio ou prestígio para provocar sofrimentos físicos e morais em seus semelhantes, valendo-se, inclusive, das diversas modalidades de força e coerção.

Para eles, o nosso basta! O Espiritismo preconiza uma vida com ética em todos os cenários. Que o futebol não (mais) dê guarida a estes elementos de moral duvidosa e que o estupro possa ser, logo, uma página distante no passado…

Imagem de Tumisu por Pixabay

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Postagem efetuada por membro do Conselho Editorial do ECK.

4 thoughts on “Espiritismo, Futebol e Estupro: o que isto tem a ver? Por Marcelo Henrique, Manoel Fernandes Neto e Nelson Santos

  1. Sem dúvida não só pelo absurdo espiritual que isso é, mas em todas esferas, famílias e mulheres ficam vendo é isso e sentindo impunidade, do tipo “estupra e depois de um tempo vida que segue pra ele como se nada houvesse” e também até no quesito comercial isso vai totalmente contra qualquer bom valor básico do ser humano.

  2. Interessantes temas para reflexão e estudo. As prisões, os processos penais e os protestos mostram que a sociedade está evoluindo. Estes fatos punitivos seriam quase que impossíveis há cerca de 30 ou 40 anos atrás. Isso denota como a sociedade evoluiu nestes ultimos anos, apesar de parecer, para muitos, quebo mundo ” não tem maisvjeito”, como dizem alguns. Mas tem jeito sim. Com mais respeito, mais amor, mais empatia, mais ética, mais paciência, mais um monte de coisas assim, boas.

  3. Interessantes temas para reflexão e estudo. As prisões, os processos penais e os protestos mostram que a sociedade está evoluindo. Estes fatos punitivos seriam quase que impossíveis há cerca de 30 ou 40 anos atrás. Isso denota como a sociedade evoluiu nestes últimos anos, apesar de parecer, para muitos, que o mundo ” não tem mais jeito”, como dizem alguns. Mas tem jeito sim. Com mais respeito, mais amor, mais empatia, mais ética, mais paciência, mais um monte de coisas assim, boas.

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