Ada P. Martins Correia
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Os espíritas exaltados constituem, assim, um grande problema que precisa ser abordado com seriedade para que a prática espírita não continue a ser tão prejudicada. Esta deve ser realizada sempre com seriedade, responsabilidade e conhecimento.
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Atualmente, o Espiritismo no Brasil possuiu um grande desafio: os inúmeros espíritas exaltados. Espíritas que exageram em suas práticas e/ou interpretações da Doutrina Espírita. Essa postura, frequentemente, gera muitos atritos, controvérsias que fragmentam grupos de estudos espíritas e o movimento espírita como um todo.
Com a pandemia surgiram muitos grupos de estudos on-line assim como canais de transmissão de conteúdo espírita, o que é bom! Porém, surgiu também o proselitismo disfarçado de convite para assistir esse ou aquele vídeo, ler esse ou aquele livro mediúnico, ir nesse ou aquele centro que, em geral, realiza passes de cura e terapias alternativas…
Vemos então, espíritas realizando insistentes convites para lives e encontros virtuais como se fosse caminho para a “salvação”. Vemos, também, os que frequentam assiduamente a Instituição Espírita, defendendo o lema “fora da caridade não há salvação”, ao mesmo tempo em que cobram a assiduidade dos outros e, no convívio familiar, se comportam com tirania e impaciência. Em casa, o único assunto passa ser o Espiritismo e os diversos romances mediúnicos.
Esse quadro toma forma porque há espíritas que buscam o espetáculo através da supervalorização das manifestações mediúnicas. Acham que as experiências mediúnicas estão no patamar de “mágicas”. Pensam que os médiuns são pessoas excepcionais e, muitas vezes, celebridades. Isto faz com que alguns médiuns, inclusive, tenham um esquema de segurança, devido ao grande assédio por parte dos exaltados. Com isso é completamente negligenciada a importância do estudo e da prática da moral espírita.
O mesmo pode ser observado em relação a alguns palestrantes espíritas, que passam de aprendizes espíritas e expositores em reuniões públicas e seminários para o status de celebridade representante da doutrina Espírita e detentor do saber: aqueles que não devem ser questionados e, sim, seguidos.
Com isso, muitos espíritas passam a ver suas práticas como o único caminho para a “salvação”: o caminho que o levará à felicidade.
Os espíritas exaltados possuem uma autopercepção de que são pessoas com uma consciência mais ampliada e que devem captar o maior número de adeptos possíveis para suas crenças. Passam a crer que conhecem a verdade e julgam ser um exemplo a ser seguido por todos, uma vez que projetam sua capacidade de compreensão e de percepção espiritual como algo maior.
É claro que, com essa autopercepção, eles adotam uma postura equivocada de profissionalismo religioso, e assumem dogmas e crenças não fundamentadas na Doutrina Espírita. Em paralelo, até as obras fundamentais da Doutrina Espírita adquirem, com eles, uma compreensão que vai na contramão da lógica e da razão recomendadas por Kardec.
O Professor francês, aliás, deixa isto claro em um texto sobre os espíritas exaltados [1]:
“A espécie humana seria perfeita, se preferisse sempre o lado bom das coisas. O exagero é prejudicial em tudo. No Espiritismo ele produz uma confiança cega e frequentemente pueril nas manifestações , no tocante ao mundo invisível, fazendo aceitar muito facilmente e sem controle aquilo que a reflexão e o exame demonstrariam ser absurdo. O entusiasmo, porém, não reflete, deslumbra. Esta espécie de capazes de convencer, porque se desconfia com razão do seu julgamento. São enganados facilmente por Espíritos mistificadores ou por pessoas que procuram explorar a sua credulidade. Se apenas eles tivessem de sofrer as consequências, o mal seria menor, mas o pior é que oferecem, sem o querer, motivos aos incrédulos, que mais procuram zombar do que se convencer e não deixam de imputar a todos o ridículo de alguns. Isso não é justo nem racional, sem dúvida, mas os adversários do Espiritismo, como se sabe, só reconhecem como boa a sua razão e pouco se importam de conhecer a fundo aquilo de que falam.”
Os espíritas exaltados constituem, assim, um grande problema que precisa ser abordado com seriedade para que a prática espírita não continue a ser tão prejudicada. Esta deve ser realizada sempre com seriedade, responsabilidade e conhecimento.
O grande problema, como ocorre na obsessão por fascinação, é que o espírita exaltado não se vê como tal. Para ele os outros é que sempre são o problema.
Fica, então, a pergunta final: como resolver esse problema que distorce a Doutrina Espírita?
Nota da Autora:
[1] Kardec, A. “O Livro dos Médiuns ou Guia dos médiuns e dos evocadores”. Trad. J. Herculano Pires. 20. Ed. São Paulo: LAKE. Primeira parte: Noções preliminares. Capítulo III, Do método. Item 28.
Imagem de John Bloor por Pixabay
Edição: Julho de 2025
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